A queda de 2,5% da produção industrial entre janeiro e fevereiro, feito o ajuste sazonal, reforçou a avaliação de que a retomada do setor parece mais fraca que o esperado pelo governo e por analistas. A retração foi puxada pelo segmento de automóveis, mas também foi disseminada e atingiu grande número de setores, revertendo a tendência de alta generalizada registrada em janeiro. Além disso, o desempenho ruim dos bens intermediários, categoria que representa cerca de metade da indústria e indica a compra de matérias-primas e insumos pelo setor de bens finais, recuou 1,3% em fevereiro, movimento também interpretado como sinal de que a atividade industrial ainda não decolou.
Ao contrário de 2012, quando havia perspectivas de que a indústria iria deslanchar no segundo semestre, como reflexo das medidas de estímulo então tomadas para reaquecer o setor, economistas apontam que a manutenção do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), reduzido para automóveis até o fim de 2013 não será suficiente para acelerar o ritmo da produção, que deve seguir moderado ao longo do ano.
Em fevereiro, 15 dos 27 ramos de atividade analisados pelo IBGE na Pesquisa Industrial Mensal – Produção Física (PIM-PF) diminuiu sua produção antes de janeiro, com destaque para o de veículos automotores, que encolheu 9,1%. Calculado pela LCA Consultores, o índice de difusão da indústria (percentual de setores que elevaram sua produção na comparação mensal com ajuste) recuou de 81,5%, na abertura do ano, para 44,4%. Na divisão por categorias de uso, apenas bens de capital cresceu no período, com alta de 1,6%.
Nas contas do IBGE (que passou a divulgar índices de difusão por categoria de uso, mas sem ajuste sazonal), apenas 34% dos setores de bens intermediários aumentaram a produção em fevereiro, em relação a janeiro, enquanto em bens de consumo duráveis essa proporção ficou em 23%, nos dois casos abaixo da média dos últimos dez anos.
O resultado de bens de capital – que acumula alta de 13,3% no primeiro bimestre deste ano em relação a 2012 e cresceu 1,1% em fevereiro sobre janeiro – foi bastante influenciado pela produção de caminhões. Enquanto nesse setor a produção de bens de transporte foi 38% maior no bimestre, a de bens de capital para a indústria foi apenas 0,39% maior.
A despeito da surpresa positiva com a evolução desse segmento, em linha com a melhora gradual esperada para o investimento em 2013, o superintendente de tesouraria do Banco Indusval & Partners, Daniel Moreli Rocha, vê a retração de 1,3% dos bens intermediários como sinal de atividade moderada para os próximos meses. Por estar no meio da cadeia, Rocha diz que essa parte da indústria funciona como um antecedente do comportamento do setor e aponta que a recuperação em curso está longe de ser vigorosa. “Provavelmente, o que temos visto desde o terceiro trimestre de 2012 é uma recomposição de estoques.”
Para o analista do Indusval, o governo estendeu o desconto no IPI sobre automóveis com o objetivo de evitar uma freada brusca na produção de bens duráveis e um acúmulo excessivo de estoques do setor automotivo, que, em fevereiro, atingiram volume suficiente para 40 dias de venda, segundo dados da Anfavea. Mesmo com a manutenção do imposto menor, Rocha afirma que é preciso acompanhar a evolução desses inventários nos próximos meses, já que um cenário de alta expressiva das vendas está descartado para este ano, após seis meses de isenção fiscal.
O gerente da coordenação de indústria do IBGE, André Luiz Macedo, disse que a produção menor de veículos também foi resultado de paralisações e férias coletivas em algumas fábricas, o que faz parte da estratégia de montadoras para ajustar seus estoques. Em sua opinião, a decisão do governo de adiar a volta do IPI pode ter algum impacto sobre a indústria, mas não há garantia de que a boa performance de outras ocasiões seja repetida, já que o ciclo de consumo de duráveis é mais longo.
Rodrigo Nishida, da LCA, também avalia que boa parte das montadoras pode ter transferido férias coletivas para fevereiro, a fim de atender as encomendas da passagem do ano, mas destaca que a queda da produção teve perfil disseminado em fevereiro. Segundo Nishida, o último resultado indica que a retomada do setor é lenta e irregular, ritmo que deve ser mantido até dezembro. “Ainda temos uma perspectiva positiva para a produção em 2013, mas está ficando mais claro que não há reação significativa”, diz o economista, que trabalha com avanço de 3% da indústria no acumulado do ano.
Com projeção de 3,2% para o crescimento da produção em 2013, a economista Fernanda Consorte, do Santander, diz que a variação negativa da indústria em fevereiro não anula essa estimativa, mas confirma seu cenário “mais cético” para a recuperação industrial traçada para o ano. Ela destaca que, a despeito das oscilações recentes nos dados mensais, a atividade do setor manufatureiro está parada há dois anos. “O ritmo de janeiro não é sustentável. Em março, o dado da produção deve ser positivo, mas muito mais baixo do que o de janeiro”, afirmou.
Como a maioria dos indicadores antecedentes referentes a março ainda não foi divulgada, os analistas ouvidos não têm projeções fechadas para o mês, mas afirmam que a queda de 1,5% do Índice de Confiança da Indústria (ICI) sobre fevereiro e a estabilidade do nível de utilização da capacidade instalada, ambos calculados pela Fundação Getulio Vargas (FGV), são indícios de que não houve uma retomada expressiva após o recuo de 2,5% registrado no segundo mês do ano. A LCA projeta alta de 0,3% da produção para o mês passado, mas Nishida ressalta que esse cálculo é preliminar.
Em nota divulgada ontem, o presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), Paulo Skaf, afirmou que o resultado compromete as chances de o país alcançar o crescimento projetado para o Produto Interno Bruto (PIB) deste ano. “Iniciamos o ano prevendo crescimento da indústria de 2,5%, e do PIB de 3%. Com esses primeiros dados, já sabemos que o desempenho industrial será menor. Se não houver mudanças na política econômica, vamos enfrentar grandes dificuldades em 2013”, afirmou Skaf.
Fonte -Fonte: Valor Econômico / Arícia Martins e Diogo Martins