A dramática situação da indústria nacional tem na energia uma de suas causas. Nossos competidores são beneficiados por políticas públicas e mercados eficientes na energia elétrica e no gás natural, enquanto aqui os custos minam a competitividade e reduzem a produção, ampliando a ociosidade dos parques fabris. E a incerteza diante dos valores futuros desaconselha investimentos, que propiciariam ganhos tecnológicos e de escala e assegurariam a recuperação do nosso espaço nos ciclos tecnológicos e de escala e assegurariam a recuperação do nosso espaço nos ciclos globais de produção. Isso resulta principalmente de uma opção do País de beneficiar os consumidores para os quais os custos com energia são poucos significativos – como os residenciais e as empresas que estão na ponta das cadeias de produção – em situações como a destinação dos benefícios das concessões do setor elétrico às distribuidoras e no controle dos preços finais da gasolina.
O irônico é que a retração do consumo industrial de energia tornou-se quase um instrumento de gestão do abastecimento, e, mantida indústria fora do foco da política energética, uma eventual recuperação da produção se transformará num problema.
O objetivo das políticas públicas deve ser a melhoria da qualidade de vida das pessoas. Mas é fundamental ter clareza sobre qual é a melhor forma de atingi-lo – neste caso, qual a contribuição do setor de energia para esse resultado. Sem essa clareza, o risco é buscarmos resposta certas para perguntas erradas, à mercê de interesses pulverizados e de intervenções pontuais.
A experiência internacional e diversos estudos mostram que energia em condições competitivas para a grande indústria resulta em geração de empregos, crescimento econômico, aumento da arrecadação, redução da inflação e outras melhorias. Tem, pois, efeitos estruturais e sustentáveis muito mais significativos para a população que a redução de poucos reais nas contas de luz – o que até estimula o desperdício.
O processo eleitoral pode dificultar o debate técnico sobre as prioridades de nossa política energética, mas também cobra da sociedade que apresente suas visões com coerência, contribuindo para a construção de soluções sistêmicas. Diante dos impactos da energia competitiva para o País, é necessário voltar o foco para o desenvolvimento de uma política industrial energética que destine os recursos à competitividade das cadeias produtivas a partir das indústrias de base que as suportam, a exemplo do que é feito por França, Alemanha e Canadá. Formas viáveis de pôr em prática esse direcionamento incluem a possibilidade de a grande indústria participar voluntariamente dos leilões de expansão do parque gerador nacional, ter acesso às cotas de energia elétrica das usinas cujas concessões venceram e ao gás que caberá à União por meio do regime de partilha, e ser desonerada, de maneira permanente, do custo de políticas públicas incidentes sobre a energia.
Ao mesmo tempo, o setor de energia tem de ser organizado para refletir o extraordinário potencial energético do Brasil. É, pois, necessário fortalecer a governança setorial, promovendo um ambiente de confiança para as decisões de investimento com os menores custos de capital possíveis, na cadeia produtiva da energia e além dela, nas cadeias que a consomem. A boa governança pede previsibilidade, transparência e isonomia. Evita conflitos de interesse, assegurando a clareza de papéis entre formuladores de política, reguladores, investidores, agentes de cada segmento e consumidores.
E, a partir da clareza de objetivos e da boa governança, é preciso valorizar a lógica econômica no funcionamento do setor, promovendo um ambiente eficiente com base na competição em torno de preços que reflitam a realidade, assegurando a todos o acesso físico à energia e a instrumentos de gestão de riscos, e garantindo a necessária liquidez do mercado. Ou seja, evoluindo na direção de mais eficiência para o setor energético e reduzindo – ou até tornando desnecessária, no futuro – uma política específica para a indústria. Mas, para chegar lá, temos de garantir que a competitividade esteja no roteiro.
Fonte -Fonte: O Estadão / Paulo Pedrosa