Educar os profissionais para o contexto no qual as organizações consideram abordagens socioambientais em sua gestão é um importante passo para que uma empresa incorpore a sustentabilidade em seu cotidiano. Para isso, é necessária uma mudança de mentalidade, de consciência, em todas as suas áreas.
Essa é uma das conclusões da pesquisa de Yara Cintra, da Faculdade de Economia, Administração e Sustentabilidade (FEA) da USP, que analisou os relatórios de sustentabilidade divulgados por 59 organizações que atuam no Brasil.
Segundo a pesquisadora, uma empresa, pela sua própria natureza, rigorosamente não se pode dizer sustentável, mas pode incorporar a ideia de ‘limite’, de ‘reposição’, de recomposição de recursos e riquezas que dizem respeito à sustentabilidade, no âmbito social, ambiental e econômico. “Um Controller, com todo o seu know-how de criar modelos de mensuração e controlar temas diversos, pode ser preparado para trabalhar com questões ligadas ao resultado social ou ambiental da empresa”, aponta a doutora em controladoria e contabilidade.
De acordo com a administradora, o conceito de sustentabilidade está na moda no universo empresarial. No entanto, nem sempre é traduzido em números, valores e indicadores, de maneira que possam ser inseridos de forma mais prática e “palpável” no dia a dia das empresas e dos profissionais.
Dessa forma, acaba não sendo tão considerado no planejamento estratégico, na avaliação de investimentos, na elaboração de orçamentos, e em outras ferramentas de gestão e controle. O direcionamento da empresa para o que é ‘sustentável’ aparece mais frequentemente quando o que está em pauta é a ‘visão’ ou a ‘missão’ da organização, ou seja, em algo mais “abstrato”.
Baseada na teoria da “sociologia institucional”, Yara analisa como o que é divulgado por meio dos relatório se integra e se relaciona com a prática do cotidiano empresarial. Em seu estudo, a sustentabilidade foi considerada sob as dimensões econômica, ambiental e social da abordagem conhecida como triple bottom line.
Para realizar sua pesquisa, a autora contactou todas as empresas atuantes no Brasil que haviam emitido relatório entre 2007 e 2009, segundo o banco de dados internacional do Global Reporting Initiative e da Corporate Register. Ao todo, 175 empresas divulgaram seus relatórios.
Dessas, 59 participaram do estudo, respondendo a um questionário. Ela obteve informações sobre a principal motivação para a divulgação de um relatório, sobre como aplicam o conceito de sustentabilidade em suas práticas de controle, e como é a participação da área de controladoria na divulgação e controle da sustentabilidade.
Como a divulgação socioambiental não é obrigatória, cada empresa decide se vai divulgar ou não o seu próprio modelo de relatório, e os indicadores que mais lhes convém, segundo o que desejam “mostrar” e como desejam “aparecer”. “Por isso a necessidade e o sentido da pesquisa: já que as empresas escolhem o que vão divulgar, devemos questionar até que ponto o que mostram à sociedade é coerente com seu comportamento no dia a dia empresarial e eficaz no que tange a sustentabilidade”, afirma a autora.
O estudo desenvolveu uma escala de notas para os relatórios, que apresentavam conteúdo muito distinto. As análises apontam que quanto mais apurada e detalhada uma divulgação, ou seja, quanto maior a nota atribuída ao relatório, mais a sustentabilidade está presente na prática da empresa, e há uma maior participação dos profissionais da controladoria nos assuntos relacionados ao conceito.
Mudança de consciência
Segundo a teoria da sociologia institucional, há duas dimensões que atuam em uma organização: a institucional e a técnica. A dimensão institucional está ligada à necessidade de a organização se legitimar diante do ambiente externo e da sociedade. Enquanto isso, a dimensão técnica trata da prática das atividades de negócios. “Muitas vezes essas dimensões estão em conflito: o que se espera do ponto de vista institucional não combina com os requerimentos técnicos do negócio.
Isso gera a coexistência de duas estruturas: a formal e a informal, a real e a cerimonial, para garantir que as exigências do ambiente e da sociedade, assim como os requerimentos de negócio, sejam igualmente atendidos. E nesse sentido, surge a importância dos relatórios para o dia a dia da empresa.”
Gerar relatórios pode colaborar para que a instituição construa consciência a respeito da sustentabilidade e das formas como o conceito pode ser aplicado. “Por meio do relatório, as empresas enxergam as necessidades de mudança em seus procedimentos”, destaca Yara. Seguindo a ideia da sociologia institucional, o que é divulgado acaba influenciando o comportamento da empresa a partir de então.
Dessa forma, o relatório serve para estimular a organização a aprimorar a inserção da busca pela sustentabilidade às suas práticas. “Futuramente, a sustentabilidade pode ser como a qualidade é hoje; não algo separado, mas parte integrante da gestão de negócios.”
As motivações para a divulgação do relatório de sustentabilidade são variadas. Quando uma organização divulga seu relatório, outras empresas também começam a divulgar, e uma segue o procedimento da outra. “Atualmente os relatórios de sustentabilidade são uma espécie de ‘moda’, e funcionam como uma bandeira, por meio da qual a organização pretende mostrar que ‘as coisas estão funcionando bem’”, afirma a autora.
O estudo mostra que as empresas elaboram seus relatórios por motivos que variam de “responsabilidade de prestar contas à sociedade” a motivações “cognitivo-culturais”, por meio da qual uma divulgação aparece como algo “natural”, como se a sustentabilidade já fizesse parte do negócio. “O relatório é o meio adequado de comunicar ações de sustentabilidade, e as empresas procuram adequar-se à demanda da sociedade por sustentabilidade”.
Mais informações:
(11) 9646-0808 ou (11) 9646-0808
email: yaracintra@usp.br, cintra@pobox.com
Fonte -Fonte: Agência USP de Notícias / Glenda Almeida