Pela terceira vez seguida após as eleições de outubro, o Banco Central (BC) aumentou a taxa básica de juros (Selic). O Comitê de Política Monetária (Copom) decidiu, por unanimidade, elevar os juros de 11,75% para 12,25 % ao ano: a maior taxa desde agosto de 2011. Os diretores do BC relevaram o fato de o crescimento do país estar próximo de zero e subiram o tom do discurso contra a alta de preços. Tiraram a palavra “parcimônia” do comunicado e indicaram que o ritmo do aperto da política de juros deve continuar.
“Avaliando o cenário macroeconômico e as perspectivas para a inflação, o Copom decidiu, por unanimidade, elevar a taxa Selic em 0,5 ponto percentual”, resumiu a diretoria da autoridade monetária.
— O BC não se mostrou sensível ao risco de uma atividade econômica mais fraca. Não há indicação de que vai reduzir, mas a gente ainda acredita que vai, porque vamos enxergar dados de atividade muito ruins no primeiro trimestre — comentou o economista-chefe do Santander, Maurício Molan, depois de ler o comunicado do BC.
A decisão do Copom – esperada pelos economistas —foi tomada em meio a um quadro econômico recheado de complexidade. A inflação pode estourar o limite máximo do sistema de metas em janeiro. O Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) encerrou o ano passado em 6,41%. O percentual ficou no teto da meta estabelecida pelo governo em 4,5%, mas com margem de tolerância de dois pontos percentuais (ou seja, até 6,5%). O BC já avisou que só conseguirá chegar no alvo no fim do ano que vem.
Para aumentar a preocupação do Copom com a inflação, o Ministério da Fazenda elevou impostos para combustíveis, o que pode resultar em um acréscimo de 0,3 ponto percentual à inflação deste ano, segundo cálculos da consultoria Gradual. Além disso, o reajuste da conta de luz pode ser maior que o estimado antes, por causa da crise vivida pelo setor elétrico. E o dólar instável também representa um perigo para os preços de matérias-primas e produtos importados. Nesse cenário, desde as eleições presidenciais, o BC optou por resgatar a credibilidade da autarquia e voltar a ancorar as expectativas para a alta de preços, que passaram os últimos anos desorientadas.
O movimento de aperto do BC ainda vai na contramão de vários países que cortaram juros para estimular a economia. Surpreendentemente, nas últimas semanas, esse grupo é formado por Suíça, Índia, Turquia e Canadá. Alguns especialistas cogitam a possibilidade de o BC seguir o mesmo caminho no futuro por causa de incertezas para a economia brasileira como um possível racionamento de energia, que pegaria a cambaleante indústria em cheio. Outro risco para o setor e, principalmente, para a agricultura, é a falta de água.
Outra questão domina as páginas policiais: o escândalo de corrupção da Petrobras terá impacto na atividade do país. A dúvida é o tamanho do estrago que a Operação Lava Jato fará no setor produtivo, já que envolve as maiores empresas brasileiras.
— Esse é o problema: tem variáveis aí que não estão no controle do Banco Central. Aliás, não estão no controle nem do próprio governo — disse o ex-secretário do Tesouro Carlos Kawall.
Segundo economistas ouvidos pelo GLOBO, a situação não é a pior justamente por causa de medidas impopulares tomadas após as eleições. A promessa de arrumar as contas públicas feita pela nova equipe econômica é a esperança de analistas para que o BC não tenha de aumentar tanto os juros para conter a inflação. A ideia é que, ao contar gastos, o governo diminua o consumo e tire pressão da alta de preços.
Apesar desse alívio esperado, os economistas apostam que o BC seguirá a apertar os juros nas próximas reuniões do Copom. A dúvida é até quando.
— Eu acho que vai até 13,25% ao ano. E acho um erro parar por aí — frisa o economista-chefe da Austin Rating, Alex Agostini.
A subida de juros era esperada. Chegou-se até em se cogitar um ajuste menor, diante do comportamento dos juros lá fora, segundo Luis Otávio Leal, economista-chefe do Banco ABC Brasil. Ele se referiu à decisão do Banco Central do Canadá de reduzir juros e a mudança de postura dos membros do BC inglês, ao aceitar por unanimidade a redução de juros.
— Na Europa, nos Estados Unidos e no Japão, as políticas monetárias são expansionistas, por causa dos efeitos da queda do preço de petróleo na inflação. Mas o comunicado foi muito neutro. Não dá para avaliar como serão os próximos passos do Copom.
Ele mantém sua projeção de mais uma alta de 0,25 ponto percentual na próxima reunião do Copom. Essa expectativa pode mudar, quando sair a ata da reunião.
Para o professor da PUC-RJ Luiz Roberto Cunha, a política monetária e fiscal está articulada agora e o fato de o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, ter desmarcado um encontro com empresários paulistas e ter anunciado o aumento de impostos poucas horas antes de viajar para o Fórum Econômico Mundial, em Davos, na Suíça, pode estar relacionada à decisão sobre juros.
— Levy deu argumentos para o Banco Central mostrar uma política monetária mais moderada.
TRABALHADORES E INDÚSTRIA CRITICAM DECISÃO
A Confederação Nacional dos Trabalhadores do Ramo Financeiro (Contraf-CUT) informou, em nota, que lamenta e condena a decisão do Copom de elevar, mais uma vez, a taxa Selic.
“O novo aumento da taxa básica de juros, somado às recentes medidas de ajuste fiscal adotadas pelo governo federal, acelera a marcha rumo a uma recessão econômica no Brasil, com trágicas consequências para os direitos, a renda e o emprego dos trabalhadores”, diz a confederação.
Para a Confederação Nacional da Indústria (CNI) o aumento dos juros básicos vai dificultar “ainda mais” a recuperação da economia.
“Os efeitos diretos dessa medida são a elevação dos custos dos financiamentos, a dificuldade de acesso ao crédito e a consequente redução do consumo das famílias e dos investimentos das empresas”, avalia a entidade.
Fonte -Fonte: O Globo