“Inclusão é sair das escolas dos diferentes e promover a escola das diferenças”. A frase é de uma das maiores especialistas em inclusão escolar no país, Maria Teresa Eglér Mantoan. Mesmo com a Lei de Cotas, boa parte delas não trabalha e nem estuda. Entre as dificuldades está a acessibilidade, seguida da escolaridade baixa e da superproteção das famílias, que não encorajam as pessoas a procurarem por um trabalho, é o que revela a coordenadora do Programa Senai de Ações Inclusivas (Psai), Denise Molina.
Segundo ela, romper estas barreiras é um dos desafios do Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial, que só este ano já qualificou 963 PcD. A instituição destina 5% de todas as vagas que são prioritárias a este público, além de garantir a estrutura, material didático e professores especializados para as diferentes necessidades especiais. “Nos últimos 10 anos houve um avanço muito grande em legislação. A Língua Brasileira de Sinais foi reconhecida por lei como meio de comunicação e expressão de comunidades de surdos do Brasil, as escolas estão se preocupando com acessibilidade, a mídia tem debatido mais o assunto e a conscientização avançou, acho que o que falta ainda é uma preocupação maior em metodologia. Que a linguagem seja mais acessível por meio de um material didático realmente adequado e adaptado à realidade dos estudantes. No Senai isso já se tornou realidade”, ponderou.
Uma das turmas de Aprendizagem Industrial para PcD começou nesta semana no Senai-Cuiabá, com 20 estudantes. Fátima Aparecida Campos, 38 anos, é uma delas. Em 2001 a jovem sofreu um acidente de automóvel que comprimiu a medula. Foram três meses de hospital e alguns anos até recuperar parte dos movimentos básicos. Hoje, cerca de 15 anos depois, ela comemora a contratação da empresa Ábaco para uma vaga de aprendizagem como assistente administrativo. “Voltar a estudar é um grande passo para mim, é recomeçar novamente, e o Senai me deu essa oportunidade e toda a estrutura que eu precisava. Mais do que isso, me deu amigos”, afirmou.
A estudante da Faculdade Senai de Tecnologia (Fatec), Camila Brandão, realiza o curso superior em Análises Químicas e será a primeira estudante a apresentar um Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) todo em língua de sinais. Para ela, que ficou surda aos dois anos por causa de uma meningite, esse é um avanço muito importante. O trabalho da jovem é focado nas indústrias e tem como objetivo facilitar a comunicação entre pessoas que não têm deficiência e os PcD. “Muitos trabalhadores com deficiência são demitidos por que não entendem as tarefas a serem executadas, além disso, o manual das máquinas e equipamentos não são traduzidos para nós. Quero contribuir para uma indústria mais inclusiva”, pontuou.
Durante o curso de Aprendizagem Industrial os estudantes têm a disciplina de Libras, isso porque muitos deles aprenderam a se comunicar sem uma linguagem própria e sim por gestos criados em diferentes situações. A professora de cursos técnicos Elizabeth Petroni, que é surda desde os sete meses de idade, quando teve catapora, aprendeu desde cedo a leitura de lábios, mas lembra que tinha muita dificuldade de aprender em sala de aula. “Passei todo o período escolar apenas copiando. Os professores só diziam para eu copiar, mas aquilo não fazia sentido para mim, era um sofrimento. Quando chegou o momento de ir para a faculdade eu disse para minha mãe que não queria passar por isso novamente. Foi quando conheci um intérprete de língua de sinais. Daquele dia em diante passei a querer aprender para ensinar outras pessoas, para que elas não passassem pelo mesmo que eu passei”, relatou.
Quando conheceu a lei que permitia a ela dar aulas, a professora buscou uma oportunidade junto a uma escola para crianças com a mesma deficiência. Depois foi para o Senai. Segundo ela, mesmo com os avanços na área de inclusão, muitas PcD permanecem esquecidas, isoladas, sem conhecer os próprios direitos. “São, em muitos casos, limitados ao ambiente familiar. Não sabem se comunicar, têm medo de se machucar, se sentem inaptos ao trabalho. Isso porque não conhecem o próprio potencial e não tem quem mostre isso a eles. É o que fazemos aqui”, revela a professora Elizabeth.
Rompendo as limitações
Um caso raro quando se trata de PcD é o da técnica em enfermagem e aprendiz do Senai-Cuiabá, Meiriane Silva Santos, 32 anos. Ela ficou ostomizada (precisa usar uma bolsa coletora) por um processo inflamatório e precisa de alguns cuidados especiais, mas nada que a impeça de estudar ou trabalhar. Por muito tempo a jovem teve de ficar afastada da sala de aula para tratamento, mas agora ela quer retornar com todo fôlego. “Eu vejo que o primeiro passo é a gente se aceitar, para que o outro possa nos aceitar também. Deficiente é eficiente. Nossos objetivos de vida são iguais a qualquer outra pessoa e precisamos lutar por eles. Sou feliz em poder fazer isso”, afirmou.
Fonte -Fonte: Folha Max