O Brasil vem comprando cada vez menos gás da Bolívia. O volume médio importado atualmente é menos da metade do de quatro anos atrás. A redução das importações pressiona a economia boliviana, que vem se deteriorando desde o fim do boom das commodities.
No acumulado do ano até julho, o Brasil comprou em média 15,2 milhões de metros cúbicos por dia, ontra a média de 32,03 milhões de m3 /dia que comparava há quatro anos, segundo o Ministério de Minas e Energia.
Nos sete primeiros meses deste ano, a venda de gás ao Brasil gerou para a Bolívia uma receita de US$ 661,58 milhões, contra US$ 817,09 milhões no mesmo período de 2018, de acordo com dados do Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços brasileiro.
Depois do Brasil, a Argentina é o segundo maior comprador do gás boliviano e também vem reduzindo as importações de gás do país vizinho. Importa atualmente uma média anual de 15 milhões de m3 /dia, contra 20 milhões de m3 /dia de quatro anos atrás.
A produção de gás da Bolívia hoje é de 44,55 milhões de m3 /dia, contra a média de 58, 4 milhões de m3 /dia em 2015. Brasil e Argentina compram a maior parte do gás produzido pela Bolívia.
As razões por trás da queda das compras de gás da Bolívia diferem. Na Argentina, a produção de gás de xisto na região de Vaca Muerta tem diminuído a necessidade de se importar o produto da Bolívia.
No caso do Brasil, um dos motivos que explicam a redução das importações de gás boliviano é o preço menor do gás natural liquefeito (GNL) no mercado internacional. Isso levou o Brasil a importar mais GNL e reduzir a compra na Bolívia, segundo a Petrobras.
Segundo o Ministério de Minas e Energia, o preço médio do GNL importado pelo Brasil caiu de US$ 7,2 por milhão de Btu, em junho – o menor valor desde junho de 1986.
Mauro Chavez, analista da consultoria Wood Mackenzie, acrescenta outros três pontos responsáveis pela menor demanda do Brasil. “Mais chuvas e aumento da capacidade de geração de energia de Belo Monte, maior penetração de fontes de energia renováveis e aumento da produção do pré-sal também explicam por que o Brasil tem comprado menos”, afirma.
Chavez estima que esse cenário não se manterá no médio prazo, pois os preços de GNL devem subir. “O preço atual mal paga o investimento de capital das plantas de liquefação, não se mantém por muito tempo. Os preços devem começar a crescer em 2021”, diz. Ele acrescenta que a questão da hidrologia, por sua vez, é incerta, e um período mais seco pode elevar a demanda pelo gás boliviano.
O fato de o Brasil ter agora um governo de direita, com Jair Bolsonaro, e a Bolívia seguir com o esquerdista Evo Morales também pesa para o país importar menos da Bolívia, afirma Osvaldo Nina, do Instituto de Estudos Avançados em Desenvolvimento (Inesad), em La Paz. “É uma decisão mais política do que econômica”, diz Nina. “Bolsonaro tem posição ideológica diferente do governo da Bolívia, e esse não alinhamento acaba se refletindo na compra de gás.”
Nina diz que, se o Brasil não precisasse do gás boliviano, o Mato Grosso não compraria mais, como tem feito. Contrato assinado em setembro prevê que a Yacimientos Petroliferos Fiscales Bolivianos (YPFB) envie 1,5 milhão de m3 /mês à Companhia Matogrossense de Gás (MT Gás). O transporte é feito pelo Gasoduto Lateral Cuiabá, que vai de Caceres, na fronteira com a Bolívia, a Cuiabá.
A maior parte da compra do gás da Bolívia é feita pela Petrobras, por meio do gasoduto Bolívia-Brasil (Gasbol), pelo contrato entre a petroleira brasileira e a YPFB.
O acordo tem vigência até 31 de dezembro deste ano e é “automaticamente prorrogado até que todo o volume máximo contratado seja retirado pela petroleira [brasileira]”, segundo a Petrobras.
Como o Brasil tem importado abaixo da capacidade máxima contratada, de cerca de 30 milhões de m3 /dia, a Petrobras fica com crédito. O prazo dependerá da capacidade de se importar o excedente não consumido. “Nesse ritmo atual, esse crédito pode durar até 2023”, diz Chavez.
No próximo contrato, ele diz, a ideia é que outras empresas além da Petrobras possam comprar o gás boliviano. O Gasbol, operado pela Petrobras, também deve ser aberto a outras empresas. A Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) está promovendo chamada pública e receberá as propostas no dia 21.
Fonte: Valor Econômico